terça-feira, 31 de março de 2009

Duppla consoantte


De onde vem esta aberrante mania dos últimos tempos de duplicar consoantes em nomes e sobrenomes?

Ilegíveis. Xenófilo, talvez. Exemplos? Claudia Leitte, Albertto, Souzza, Robertto, Almeidda e até Pintto! Os nomes já não eram bonitos?

Mas o mais impronunciável é a grife Colcci. Será arremedo de Colucci ou Colci? Mas como flexionar a dupla "c" depois do "l"? Como fica isso foneticamente, caz...çarola?

domingo, 29 de março de 2009

Seu Simão

Creedence, a trilha sonora dos meus 11 a 12 anos.

Seu Simão da esquina, o bigodudo, foi sinônimo de tubaína para mim. Pelo menos entre 70 a 73, quando eu morava ao lado do seu bar. Lá, além desta bebida de almoço, comprava lanches Mirabel verde (de chocolate), balas Juquinha, balas de goma Jujuba e paçoquinhas de amendoim. Ah, e o pirulito Zorro, que grudava nos dentes. Todos com grau de açucar proibitivo, para a alegria dos dentistas.

Como fundo musical, havia a radiola vermelha de minhas irmãs. Que deixavam correr Creedence, America, Cat Stevens ou Led Zeppelin. A primogênita era única a seguir o meu pai, preferindo as eruditas. Eu, caçula, preferia o Vila Sésamo e Jackson Five. Minhas irmãs eram bacanérrimas, com calças Lee adquiridas na Galeria Pajé e malhas cacharrel vermelhas, pretas, brancas, azuis...

Certamente o seu Simão já se foi. Mas num cantinho da minha memória, ele ainda está presente. Por conta destes doces .

sexta-feira, 27 de março de 2009

Conservas de Tsukemono


Não vivo sem o tsukemono, conserva à moda japonesa de verduras em salmoura. De nabo, acelga, pepino, alga, cenoura ou cebolinha lakyô, com suas mil combinações e versões de tempero. Sal, missô ou shoyu, curta ou longa conservação, não importa. Odor à parte, é túdibom.

Na falta de espaço na mala, viajei muitas vezes com o excesso de tsukemono na bagagem de mão, seja de retorno do Japão ou do Brasil. O bom de cães aduaneiros é que desconhecem esta iguaria. Na embalagem japonesa eu podia confiar; mas na brasileira, a solução era fingir sono durante o vôo. Ou mostrar inocência como quem "não fui eu"...

Este final de semana vou à feira comprar acelgas. Quero preparar kimuchi coreano. Vinte anos atrás, havia apenas uma loja em toda Milão para comprar acelgas e nabos provenientes da Alemanha. A preço exorbitante! Hoje, sou beneficiada por tabela, graças ao aumento de consumo por chineses que vivem no país. Este final de semana, a minha mesa promete ser toda japonesa.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Trindade, a praia


Digitei "Trindade" na busca por um conceito cristão, e bela surpresa, acabei nas águas "daquela" Trindade, a de Parati. Inútil dizer que entrei num turbilhão de lembranças dos meus tempos de excessos, coisas de 30 anos atrás.

Trindade me lembra 78, o ano em que entrei em Arquitetura, para seis meses depois, mudar de idéia por uma outra área, razão porque a memória é fresca. Por extensão, as praias de Ubatumirim, quando dormíamos nas casas de pescadores da região. E, claro, os surfistas de Itamambuca e do Sapê.

Foi também em Trindade, numa semana chuvosa daquele ano, um dos últimos excessos com o Patcho e Cia, aquele que se banhava em perfume patchouli. Possuía um Fusca antigo, todo enferrujado, mas o único a subir o morro de lamas sem a corrente nas rodas. Não me lembro se ainda o encontrei no festival de inverno em Ouro Preto, naqueles mesmos anos. Devo aumentar a dose de fosfosol.

Mas em seguida, vieram os anos 80, trazendo os primeiros sinais da crise econômica, os sindicatos do ABC, a guerra das Malvinas e a consciência de que o panorama sucessivo não era nada róseo.

Depois de 30 anos, estou pensando em dar uma passada por Trindade, na primeira oportunidade. Estará tudo diferente, claro. E eu também.

terça-feira, 24 de março de 2009

Especulação e choradeira


Vivo no primeiro de um típico edifício milanês de 5 andares, construído nos primeiros anos de 1900. Nada o distingue de outros edifícios em torno, quase todos precedentes ou deste mesmo período. E como ocorre com toda a área urbana de certo peso histórico, novas edificações são raras, senão por razões extremas, como abandono de proprietários, perigo de dano a terceiros e outras causas naturais.

O resultado disso é que a a área urbana milanesa sofre enorme déficit de imóveis para quem necessita viver próximo ao centro financeiro e comercial, criando assim, um próspero mercado de especulações. Na falta de novas construções, especula-se sobre adaptações, ao limite da legalização. Seja para alugar ou para comprar.

Há pouco mais de dois anos, uma construtora adquiriu um imóvel logo abaixo do meu apartamento, no andar térreo. Diante da incredulidade dos moradores, decidiu-se que daquele pequeno espaço "extrairia" quatro novos apartamentos. A equação nos soava como quem colocaria a população paulistana dentro de Campinas. Além disso, o andar térreo em edifícios como este quase nunca é ocupado para uso residencial.

Entre fiscalização, desvios de burocracias e constantes paralizações da obra, passei um ano à beira de histeria, suportando rumores de britadeiras e marteladas no andar inferior. Confesso, a obra atiçava a minha curiosidade, sobre quem compraria um imóvel cujas janelas dariam diretamente à calçada.

Um ano depois do estressante rumor, conhecí finalmente o que a construtora chamava pretensamente de lofts. Cada apartamento é um ambiente único, que mede pouco mais de 3 metros de largura por 4 de comprimento, com um banheiro cego num dos ângulos. Para aproveitar o pé-direito de 3,5 metros de altura, criou-se um micromezanino onde cabe apenas uma cama de casal, e nada mais. No total de 24 metros quadrados, está incluída a metragem do mezanino, é óbvio. O preço? Exatos 280 mil euros, sem possibilidade de um desconto.

Até agora, apenas um comprador veio se estabelecer no imóvel, às vésperas da crise financeira. Um morador com seus 40 anos, com ares de profissional bem sucedido, como era previsível. Nenhum trabalhador médio poderia se permitir a este preço, sem falar do exíguo espaço. Com o agravamento da crise, outras 3 unidades continuam mofando sem um comprador, mas seus preços não baixaram de uma vírgula sequer, desde a inauguração.

E não é que vejo construtoras como estas nos debates de TV, chorando as pitangas por uma ajuda do governo e culpando a crise pela paralização de vendas no setor?

segunda-feira, 23 de março de 2009

Família-fantama


A Igreja os condena e o Estado não os reconhece.

No entanto, há hoje cerca de 100 mil crianças, filhos de casais homossexuais na Itália, segundo um levantamento divulgado semana passada pela Associação de Pais Homossexuais "Famiglia Arcobaleno".

Com duas mães ou dois pais, filhos destes núcleos - muitos deles já adolescentes - ,são frutos de recursos obtidos através de inúmeros obstáculos burocráticos, como fecundação artificial e adoções no exterior. Segundo os educadores e psicólogos que acompanham estas crianças, não há nenhum indício de que os seus desenvolvimentos sejam diferentes de outras. Ao contrário, são serenas e conscientes do seu status, por receber redobrada orientação de pais com bagagem e experiência em dversidade. Afinal, quem melhor conhece a marginalização social senão eles?

Só lhes resta um governo melhor que este, para que seus núcleos sejam reconhecidos juridicamente.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Quota para crianças


Com finalidade de limitar a presença de crianças estrangeiras nas escolas públicas italianas, a ministra Mariastella Gelmini, do Ministério de Instrução do governo Berlusconi, deu hoje uma entrevista na qual afirma a possibilidade de introduzir um teto de apenas 30% de alunos estrangeiros em cada classe. O projeto poderá ser operativo a partir do próximo ano.

A ministra se esquece, porém, que a grande maioria destas crianças é nascida na Itália, cujos pais, imigrantes ou não, vivem, trabalham e pagam regularmente os impostos como um cidadão italiano qualquer.

Me transportei instintivamente aos anos 60, na minha escolinha primária. Sendo eu, filha de imigrantes japoneses, me imaginei sofrendo uma quarenta social por uma lei fascista como esta, sem acesso à escola e à cultura. Como outros companheiros de classe, claro, filhos de italianos, espanhóis, gregos, chineses e libaneses, até onde eu me lembre.

Dada a média italiana de 20 alunos por classe, na qual apenas 6 serão estrangeiros, o que serão de outras crianças excedentes que não puderem entrar na quota?

A propósito, em que século estamos mesmo?

quarta-feira, 18 de março de 2009

Milão X Tóquio


É inevitável que os japoneses que recebo em Milão acabem por comparar o custo de vida local ao de suas respectivas cidades. O que me surpreende é que mesmo os de Tóquio, se espantem com preços de muitos bens de consumo. E ao conhecer uma miríade de taxas e pesados impostos locais, acabam por questionar os parâmetros aplicados por estudiosos econômicos que de tempo em tempo estabelecem rankings de cidades mais caras do mundo.

Se o salário médio italiano está entre €1.200 a €1.400 líquidos, os valores mais elevados são atribuídos ao milanês, por concentrar em si toda a atividade econômico-financeira do país. Mas comporta também os paradoxos. Com a liberalização de mercados nos últimos 10 anos, os jovens recém-formados (e pós-graduados) sucumbem a novos contratos com salários entre €900 a €1.000, quase sempre em áreas mais disparatadas e sob a constante pressão de ver a renovação negada. Situação inversa ao de operários com salários superiores, garantidos pelos velhos contratos, como também de prestadores de serviços como encanadores, pintores, eletricistas ou pedreiros. Mesmo um engenheiro formado neste mesmo período, com experiência inferior a 5 anos, pode não chegar a €2.000 líquidos.

Isso explica a razão de quase 70% de solteiros do país, entre 25 a 35 anos de idade, viverem com a família por longos anos. O aluguel de um apartamento mais econômico, o monolocale, custa em média €800 nos bairros milaneses. Isso já representa de 60 a 80% do salário destes jovens. Trata-se de imóvel com ambiente único e banheiro, com menos de 30 metros quadrados, correspondente ao que chamam de "one-room mansion" no Japão.

O mercado imobiliário milanês não oferece alternativas como quartos de aluguel ou pensões para os menos abonados. Ao contrário, o que Tóquio carece de espaço, há de opções de preços. A mesma tipologia de imóvel, com espaço físico pouco menor que o milanês, custa em torno de 30 a 35% do salário médio de um jovem profissional da capital.

O hipotético Giovanni, um bancário milanês de 30 anos, com seus €1.200 mensais pode apenas sonhar com a vida independente. Ainda que fosse possível, ele deve ainda incluir nas equações o seguro e taxas obrigatórios do carro, cujo modelo popular não sai por menos de €800 ao ano. Há despesas domésticas como luz, telefone e gás (mínimo €50 cada conta), além do combustível e alimentos. E há a despesa diária do almoço.

Com exceção das grandes empresas, que oferecem bônus-alimentação para o almoço - ainda que a metade do valor seja completado do próprio bolso - ,um trabalhador de média e pequena empresas possui duas opções econômicas: um sanduíche e uma bebida por €6 a €7. Ou um prato comercial de €12 a €15 nos bares mais modestos.

Num rápido cálculo, um prato comercial custa a Giovanni cerca de 1,2% do seu salário, enquanto ao bancário Hideki, o seu correspondente japonês de Tóquio, bastará 0,5% do salário médio de 170 mil yens que lhe cabe, ao pedir um teishoku popular. A esta altura, se Giovanni tiver o aluguel sobre os ombros, comer fora à noite se torna um devaneio. Um modesto jantar numa trattoria comum, consultando cuidadosamente a coluna de preços e não o de pratos, gasta-se em média €30 por pessoa, ou 2,5% do salário. Mesmo num hapy-hour no bar da esquina, arrisca-se a desembolsar €20 em poucos minutos.

Como diz um velho cliente de Tóquio, que há mais de 20 anos acompanha o processo econômico italiano, não há economia mais precisa que a do bolso do cidadão comum, que ele chama de "economia de percepção". O resto, é estatística fria saída de confortáveis muros de gabinetes.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Cartas de Demissão



Acabei de traduzir 6 páginas de cartas de demissão. Missão dolorosa e ingrata ao prever a reação dos que receberão a notícia nesta segunda-feira.

Serão entregues a quatro profissionais italianos, funcionários especialistas em uma empresa japonesa no setor de alimentos, localizada a cerca de 100 quilômetros de Tóquio. Cada qual com motivações diferentes que justificam a decisão, mas agravadas com a crise financeira internacional que assombra o país.

Com a revogação do contrato de trabalho, a empresa se dispõe a cumprir os encargos sociais e trabalhistas, além de cobrir as despesas de transporte aos funcionários que retornarão à Itália.

Com seus retornos, serão mais quatro desempregados a se unir à estatística italiana de fevereiro. Saíram esta semana os dados oficiais do Inps italiano, Instituto Nacional de Previdência Social. Entre janeiro e fevereiro, mais de 370 mil novos desempregados entraram com o pedido de subsídio, o seguro-desemprego.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Delação



Os sindicatos e associações que representam a classe médica italiana e profissionais da área de Saúde reconfirmam a desobediência: Não à obrigação de delatar imigrantes clandestinos aos órgãos de Polícia.

O protesto dos médicos e funcionários de hospitais públicos se refere à nova emenda que os obriga a denunciar pacientes estrangeiros ilegais no momento em que estes derem entrada em qualquer estrutura sanitária pública deste país. A emenda - já aprovada pelo Senado em fevereiro e agora sob a avaliação da Câmera - se apóia na nova lei que estabelece a clandestinidade como reato. Um imigrante sem um visto regular passa a ser criminoso e prevê penas de 6 meses a 4 anos de detenção. Mais detalhes desta lei aquí BBC Brasil

A consternação da classe médica por esta emenda não se restringe apenas à questão humanitária. Como funcionários do Estado, a não-denúncia ou omissão comportará a pena por "Favorecimento à Imigração Clandestina", maliciosamente inserida no texto a ser aprovado. Ou se delata, ou serão denunciados.

Sem palavras.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Condomínio de passarinhos


É frustrante sentir a primavera batendo à porta e possuir apenas estes vasos para recebê-la. Pudera morar numa casa com um jardim. Me bastariam dois metros de terra. Para poder observar de perto o microcosmo de insetos em festa pela chegada da abundância, em simbiose com a força dos brotos.

Quem já está em alvoroço há mais de uma semana, e já às 5 da manhã, são os passarinhos. Todos os anos eles formam uma espécie de condomínio ornitológico sobre a imensa árvore de magnólia, logo ao lado da janela do meu quarto. A árvore tem mais de 10 metros de altura, e cada espécie parece ocupar os respectivos andares. Os menores no alto e os maiores em baixo, onde há mais espaço entre os galhos.

O minicondomínio neste período é uma alegre orquestra. Eles transam, cantam, constroem seus ninhos, alimentam seus filhotes e fazem arruaças já de madrugada. E brigam, como qualquer condômino humano! Ao entardecer, realizam até happy-hours quando retornam à casa. E lá pelas 9 da noite, já cansados, todos entram num profundo sono.

São estas pequenas criaturas de primavera que me dão a grande inspiração para repensar a vida. E de querer arejar também o meu microcosmo.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Sushi chinês



Agradeço imensamente aos chineses da Itália por este prato de sushi. Não fosse o aguçado senso de oportunidade deles, não poderia pedir nem menos esta corruptela de cozinha japonesa sem consultar primeiro a carteira ou a coluna de preços do menú. Ou teria que desembolsar de €50 a €70 por pessoa, num dos restaurantes japoneses autênticos, com o selo de garantia bem visível à porta, emitido por uma associação gastronômica japonesa que "combate" a imitação.

E, se por um momento de insanidade mental, eu escolhesse a alta gastronomia de "Nobu", - aquele mesmo, de Nova York - aquí situado dentro da loja Armani, a conta saltaria de €100 a €150 por pessoa. E olha lá, € 100 ficando apenas no antepasto. Há de se compreender porque Giorgio Armani investiu pesado para convencer Nobuyuki Matsuhisa a abrir sua filial dentro do quadrilátero da moda. Armani, se sabe, não renuncia - ao menos uma vez ao dia - à cozinha japonesa.

Neste chinês, perto de casa? O sushi, missoshiru e uma saladinha de algas saíram por €20 por pessoa, muito barato para a realidade local. O sabor? Digamos, hipoteticamente japonês. Algo como feijoada preparada com lentilhas. Ou o ketchup num espaguete. Visualmente quase convence. Mas para quem não resiste à saudade dos teishoku lá da Liba, em São Paulo, é só fechar um olho. Já se for comparar aos do Japão, meu conselho é que feche os dois.

A proliferação de restaurantes japoneses fakes, comandados por improvisados cozinheiros chineses, já virou até "tradição" por aquí. Os primeiros chineses a "virar a casaca" com a alta da gastronomia japonesa já tem mais de 10 anos. Dalí, a conversão do pato lacado para o peixe cru foi fulminante. Hoje, já existem muitos restaurantes japoneses cujos chefs chineses investiram pesado em cursos no Japão, ou adquiriram técnicas sob um chef japonês, mesmo sem sair de Milão. O que ainda falta é repensar nos nomes. Ainda se vê aquí e alí nomes como Restaurante Japonês "A Grande Muralha", Sushi Bar "Dragão Vermelho" ou Cozinha Japonesa "Lanterna Vermelha", mas aí já é implicação demais.

E há chineses que optaram também pela cozinha italiana, e nesta, é de tirar o chapéu. Há realmente excelentes cozinheiros de deixar qualquer cozinha "della nonna" boquiaberta. E por oferecer preços muito abaixo do mercado, as filas no almoço são inevitáveis.

Ao menos com os nomes italianos são mais convincentes. Os letreiros exibem nomes como "Cucina Italiana Nonna Amelia", "Tavola Calda Bella Napoli" ou "Ristorante Mediterraneo Marenostrum" e por aí vai. Palmas para os chineses. A minha carteira agradece, de coração.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Caro Celular


Não me surpreendí com o resultado de uma pesquisa da ONU divulgada esta semana. Ela revela que a telefonia no Brasil é uma das mais caras do mundo, da qual apenas o celular consome 7,5% da renda média per capita do país. A fixa não fica muito atrás, consumindo 5,9% da renda. Chamar de absurdo soa até como um eufemismo.

Além de cara, nos exige equações das mais complexas para compreender os serviços e horários de descontos, oferecidos por cada uma das companhias. E o que dizer da tarifa diferenciada quando dois concorrentes se falam. O que justifica o preço mais elevado, apenas porque um usuário da Claro telefona a outro da Tim? Sem dizer que quem recebe ligações distantes também paga para ouvir!

Nos últimos 5 anos, estive no Brasil uma vez a cada 6 meses, por motivos familiares. Para resolver empenhos dentro do limitado tempo de permanência, me apóio na Tim, opção supostamente mais econômica em razão da família, que utiliza o mesmo serviço.

Além desta "vantagem", - até tempos atrás - ela me assegurava que a validade da recarga era de 6 meses, antes que caducasse e eu perdesse definitivamente o número. Prevenindo o meu retorno sucessivo ao Brasil depois de poucos meses, eu o recarregava no dia de embarque para Milão, para não dar margem a erros. De volta ao Brasil - e dentro ainda da validade da recarga anterior intacta - a Tim desconversava alegando novas diretrizes da empresa e outras mil mudanças internas (com jargões informáticos), sugerindo que eu adquirisse um novo chip. E uma nova recarga, naturalmente. Por duas vezes caí nesta conversa de validade.

Sou, por natureza, monossilábica ao telefone. E avessa ao bate-papo ao celular. Em geral, me bastam 30 segundos para eu transmitir o necessário. Ainda assim, - e apenas para ilustrar a última viagem ao Brasil, em julho passado - gastei cerca de 300 reais de recargas em 25 dias. Apenas de ligações-relâmpago, limitadas a grande São Paulo e por razões realmente emergenciais. Até porque sou usuária do orelhão para assuntos de importância secundária. Despesa que não foi diferente das viagens precedentes.

Isso corresponde a cerca de 100 euros, suficientes para eu recarregar o celular por 3 meses ou até mais na Itália, quando a minha carga de trabalho é menor. O telefone público se tornou uma raridade neste país, o que torna o celular indispensável e único para todas as comunicações.

Dado o meu último custo no Brasil, me pergunto quanto gastam os profissionais como vendedores e representantes, cujo uso do celular é indispensável para o trabalho e sobrevivência. Para justificar o custo de 7,5% da renda média, não é difícil supor que o brasileiro esteja arcando um custo no qual estão embutidas as contas de subornos e lobbies dos políticos.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Desemprego



A versão online do jornal italiano La Repubblica abriu ontem um espaço no qual os leitores podem mandar seus breves depoimentos sobre o drama do desemprego. Até esta manhã, já haviam quase 900 mails de homens, mulheres e jovens dos mais variados setores e profissões, cujas idades, na minha rápida visão, se concentram entre 35 a 55 anos.

De setembro a janeiro deste ano, 20 mil trabalhadores fixos perderam seus empregos neste país, e dos 3 milhões de trabalhadores por contrato com o prazo a vencer este ano, apenas 40 a 75 mil poderão assinar sua renovação, segundo sindicatos. A consequência já é previsível.

Numa realidade em que não se permite soluções pessoais através de "jeitinhos", recomendações, cabides e muito meno o trabalho informal no qual se reparar, o drama descrito em primeira pessoa traduz a crise com mais precisão que qualquer estatística com números frios.
Nos depoimentos, nota-se um grande número de mulheres profissionais, que se perguntam como poderão reinserir-se no já minguado mercado de trabalho e ainda passar pelo crivo da idade sem perder a própria dignidade. E há ainda a família, os filhos e a educação futura, já que a economia doméstica para a família média italiana (como para o resto do continente) é sustentada por dois pilares.

De fato, não conheço mulheres ao meu redor que não trabalhe. Por necessidade ou não, casadas ou solteiras, com ou sem filhos. Para a grande maioria delas, o trabalho está relacionado à dignidade como um bem individual, e não adquirido através de parceiros. A filosofia de "encostar o burro à sombra" não subsiste nem mesmo nas regiões mais pobres do país. As poucas mulheres que não trabalham fora, - ou, que não possan auxiliar na economia doméstica - há quase sempre razões familiares que vão além da questão econômica.

Um fato que chama a atenção é que quase todos os depoimentos pelos quais passei os olhos, citam a armadilha do mobbing (humilhação no exercício profissional para forçar a demissão) na qual caíram como presas. Através de intrigas, perseguições e pressões por parte dos companheiros de trabalho como das empresas. Um inferno gerado pela concorrência e pelo medo do desemprego, num maldoso jogo de poder. Há os que já não descartam o suicídio; uns vivem imersos em profunda depressão e outros em dívidas acumuladas, sem citar as consequentes fragmentações familiares.

Mesmo que a insegurança com o desemprego pareça alarmar mais as mulheres que os homens, na minha rápida leitura observo que elas tendem a ser mais tenazes em encontrar novas soluções e dispostas a virar rapidamente a página. Mesmo a custo de sucumbir a salários inferiores ou aceitar funções menos qualificadas. Neste aspecto, os homens parecem mais vulneráveis, por tocar o orgulho e a dignidade. Será talvez a distante herança cultural, que ao longos dos séculos estabeleceu a figura masculina como o pilar de todas as instituições sociais.

E pensar que estamos apenas no início da crise...

segunda-feira, 2 de março de 2009

Classe econômica


Posição do poleiro da classe econômica. Nem em pé e nem sentado.

Como muitos já devem ter lido, a Ryanair, companhia aérea irlandesa de baixo custo começará em breve a cobrar 1 libra pelo uso do banheiro, durante o vôo. Outro corte nas despesas para baixar ainda mais o preço das passagens é a eliminação dos balcões de check-in, cujo serviço estará on-line, por conta dos passageiros.

Se as medidas beneficiam o bolso do passageiro e não o lucro da empresa, a idéia não é má. Considerando que ela opera apenas no continente europeu, mesmo um passageiro que esteja com algum distúrbio intestinal, gastará 2 ou 3 libras no máximo, já que seus vôo não duram mais que 2 horas.

Fiquei pensando se a moda de corte nas despesas pegasse também os vôos intercontinentais. Se já transformaram a classe econômica em poleiro, deixar as galinhas sem o banheiro grátis antes do abate seria crueldade extrema. Sobretudo os idosos e mães de filhos pequenos. Do que sobra, não há muito o que subtrair dos passageiros. A comida? O manto eletrizado? Os filmes? Passageiros em pé, como nos ônibus urbanos?

Já fantasiei infinitas engenharias para amenizar a tortura. Poltronas-beliches ou triliches comandadas por controle remoto; eliminar a classe executiva e transformá-la num grande hall com camas dobráveis até o teto ou criar vôos-cargo só para as nossas bagagens e transformar a barriga do avião num imenso dormitório. Mesmo sob 50 graus negativos!

Se os preços das passagens fossem estabelecidos segundo os serviços opcionais, eu cortaria a comida plastificada. Menos o chafezinho quente. Desde que disponibilizem microondas a bordo. E que os aeroportos vendam marmitex a preço popular, e não a preço de monopólio.

Em todo o caso, até o fatídico 11 de setembro, sempre embarquei com a minha sacolinha. Com água, sucos, cervejinhas, lanchinhos e frutas, sempre disponíveis sob a poltrona. O brasileiro sempre temeu o que chamam de "farofagem", mas por várias vezes embarquei do Brasil com meia dúzia de pastéis, coxinhas e quibes na mão. E comí a bordo sob muitos olhares invejosos. Menos dos europeus e japoneses, habituados a abrir seus lanches em qualquer lugar.

Outra coisa que eu cortaria são os filmes e os brindes, desde que aumentem os centímetros quadrados entre as poltronas. Como meias, cremes ou escovas de dentes. Quem não viaja sem a própria escovinha? Há quem entre com aquela meia 100% sintético no chão molhado do banheiro, mas eu prefiro arrastar meus pés inchados enroscando os sapatos até lá. Até porque aquele cubículo beneficia apenas os homens, que podem fazê-los em pé. E ainda assim, o fazem fora do alvo.
Mas entre todas as opções acima, melhor mesmo é ganhar na loteria e viajar com o próprio avião. Ou apenas de classe executiva, - ainda que eu seja contrária à divisão de classes. Creio que a probabilidade de acertar uma loteria seja mais próxima à realidade do que as companhias alargarem suas poltronas...