quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Bailinhos e Vassouras


Quando a garagem não era cedida por um compreensivo pai, a mesa do pequeno promotor de turno ficava no canto da sala, à disposição de todos. Tigela de cristal cheia de ponche, com maçãs e abacaxis flutuantes, canapés de patê de sardinha e a primeira bebida de batismo para os grandinhos em vias de pequenas transgressões, a cuba libre.

Os meninos, que até poucas horas antes do banho brincavam com carrinhos de rolimã e as mais novas de bibelôs ou bambolês, se viam repentinamente com a estranha palpitação no peito diante daquela garotada em suas melhores roupas de festa. Era a vez das testosteronas brincar com todos eles.

Quando o ponche já começava a tocar o fundo da tigela, os garotos eletrizados já sabiam o que fazer. Com vassoura à vista, espontaneamente abria-se um espaço ao centro, recostando todos à parede. Entrava em cena a luz negra, em perfeita sincronia com os primeiros acordes do 'protodeejay', - que não passava de garoto mais abonado do bairro com a própria vitrola. Vitrolinhas vermelhas ou azuis, que mais pareciam brinquedos e que hoje encantam colecionadores saudosistas.

E vai com Ben, do garoto 'Maicon' Jackson! As mais tímidas fingiam conversar com as amiguinhas, ainda que seus corações bombassem a mil por hora. As mais precoces já sabiam jogar os primeiros charmes e a provocar conflito entre os meninos. Por elas, a vassoura se alternava repetidamente no temor que as músicas terminassem. Tínhamos que retornar às 10 em casa, ainda que o bailinho fosse ali na esquina, na própria calçada. As horas pareciam passar em minutos.

Naqueles primeiros bailinhos, inesperadas protuberâncias entre os corpos coladinhos nos indicavam - entre receio e curiosidade ingênua - as primeiras descobertas da própria sexualidade, antes de deixar a infância. E a vassoura - este objeto ordinário e doméstico - , se tornava o barômetro das nossas primeiras vaidades naquele início dos anos 70.

Poucos anos depois, Yes, Led Zeppelin e Deep Purple ocupariam nossas mentes mais insanas, arrastando a inocência de 'Maicon' para trás.
* À Tânia, com afeto inalterado no tempo e no espaço.


12 comentários:

Adrina disse...

Eu fui adolescente nos anos 90, e ainda assim o horário de chegar era, "no máximo" (como gostava de frisar a mama), às 10. Fui a poucas festinhas nesse período, mas a impossível não se comover com essa história. ;)

Anônimo disse...

Pior era não gostar destes bailes e ter que ir para vigiar os mais novos.rsrsrs.

Anônimo disse...

Naquela escuridão o menino feio ficava até lindo! Como a maioria era de meninas, o menino feio ficava até disputado!

Anna

LuMa disse...

Adrina, Diu e Anna:
Com ou sem cuba libre, concluo que eu era feliz e não sabia :) PS: Eu usava uma blusinha chamada 'cacharrel', modinha daqueles tempos. Ah, e a calça era de tergal :)

KS Nei disse...

Pode crer.

Hahahahaha.

KS Nei disse...

Eh o inferno de quem acredita no paraiso.
E nao eh vice e versa.

Anônimo disse...

Me lembro muito bem uma vez vç Luma me fez uma gorra e um cachecol vermelho para eu usar num bailinho que eu usei com um blusa branca de gola, a famosa cacharrel, me senti!!!!!!!bjusss

LuMa disse...

Regina:
Tô até agora espremendo a minha memória (tô precisando de Fosfosol)pra lembrar desse cachecol que te fiz e não consigo, menina! Fiz em crochê? Mondiê, qdo, como, onde, porquê? Não-me-lembro-de-nadinha, será que os anos começam a se manifestar? Beijinhos

Unknown disse...

e o mais legal é que os meninos ficavam agrupados num canto e as meninas em outro, até que, como vc frisou, tocavam "BEN", aí era um tal de correr para 'pegar' a menina mais disputada... áureos tempos aqueles... muito antes das preocupações universitárias, profissionais e adultas!
eu mesmo tinha uma vitrolinha azul e um monte de discos (LPs e compactos) que comprava com o pagamento por ajudar meus pais na tinturaria...

LuMa disse...

Shoiti:
Eu tinha uma calça 'pantalona' de tergal cor-de-abóbora(!)com a qual ia em todas as festinhas. E durante o dia eu assistia ao "Perdidos no Espaço" ou "Túnel do Tempo". Ah, e claro, "Os Waltons". Adorava o John Boy, meu ídolo,rs.

maker disse...

que raridade, eu passava na rua, próximo aos portões, e ouvia as musicas, não me deixavam entrar ainda mas eu ficava louco pra saber o que acontecia lá dentro rs, depois chegou a minha época e curti muito, linda lembrança, lindo texto, bjk. Obrigado pelo depoimento no autores, amei, bye.

LuMa disse...

Maker:
Estes bailinhos valeram como batismo para a passagem à adolescência, e superada esta, mal sabíamos que o caminho para a fase adulta seria tudo em aclive. Eu ainda continuo subindo a ladeira:)